sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Sorvete sem Nome




Sorvete de pistache, com gotas de chocolate. Pintura a guache – pensei - que não desbota nem com o aquecimento global.

Se flor tivesse o abacate, seria apropriado adorna-la assim, delicada, menininha, gelado na casquinha.

Te conheci na Uruguaiana, leviana, passeando paralelos em salto agulha, sol na tarde refletida nos teus olhos à paisana. Procurando quem, não sei. Me achou assim, assim, como quem tropeça em vento.

Agora, lento, revejo aquela tarde em pensamento e insisto que talvez houvesse ainda agora, aqui, teu aroma sapoti, tua presença escandalosa de mulher em mim.

Achou-me assim, como quem tropeça em vento e me virei, desbotado, escorando teus braços quando caía estabanada, como cana ceifada nos seus doces anos.

Agradeceu-me, morreu de susto, corou-se um tanto e envergonhada ficou mais linda e desajeitada, então sorriu, ainda tonta.

Tremeu e ficou séria e seu olhar me viu e uma história louca apareceu no ar, de amor antigo, de uma vida outra, de um tempo estranho em que foi minha, sem nunca ter sido, e me deu paz, e fui feliz um instante eterno e a voz sumiu e fiquei mudo em meio ao caos de carros e buzinas e passantes. Fiquei mudo, só sentia.

Endireitou-se no vestido verde uva e aguardou, me olhando, uma palavra, algum convite, uma saída para um mundo paralelo, onde houvesse ela e eu e uma volúpia imensa. Fiquei mudo e tensa disfarçou, falou da chuva e a tarde quente e ainda algo irrelevante sobre saltos altos o bastante para jogá-la ao chão.

Então seguiu na contramão, e fiquei assim, como quem perde um sonho, mudo ainda e incapaz. Num instante percebi que nem seu nome eu saberia naquela tarde e nunca mais.